quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Do ponto inicial

Imagine-se sentado na cadeira de um consultório médico. Você foi ver o resultado de uns exames, porque há algum tempo estava sentindo um "carocinho" na costela. Ele diz que terá que fazer uma biópsia. Bom, você tem 12 anos e não entende muito bem o que está acontecendo. Tudo é novo, mas, de certa forma, até divertido, pois você tem o que contar para os amigos na escola: "Fiz uma tomografia", "Lá no centro cirúrgico tem um monte de luz e umas pessoas de roupa verde e touca de bichinho". Você entra e sai de um hospital, em que o letreiro na fachada avisa "Hospital do Câncer", mas sua mãe te diz que todo tipo de "carocinho" é tratado ali, e não há com que se preocupar. Com o resultado da biópsia, outra notícia: você terá que fazer uma cirurgia; tirar a costela e colocar no lugar uma prótese de "cimento". Pessoas começam a ir à sua casa, te desejando boa sorte e enchendo os olhos de lágrima, e você continua perdido.

1ª cirurgia - 09/10/2001: Do pouco que lembro, ficou a "melhor" parte. Era véspera de dia das crianças e eu ganhei um saco cheio de presentes da ONG Viver (Organização em prol de crianças e adolescentes em tratamento oncológico, em Londrina) - alguns dos quais tenho até hoje. Se bem que não me interessei muito por eles antes que pudesse me aliviar da dor. Compondo a parte ruim das lembranças: acordar na UTI e pedir pela mãe, além da sensação angustiante de falta de ar, incontrolável pra uma criança da minha idade. Curada, eu ainda não sabia que o que tinha tirado era um câncer. Mas continuei indo àquele hospital, e lendo aquele nome, até me tocar do que realmente estava acontecendo. Entre consultas e exames de rotina, passaram-se 5 anos sem surgir nenhuma recidiva - foi nesse entremeio que perdi meu pai. Os meus cabelos também continuavam intactos. Eu já estava no final do primeiro ano da graduação. Eis que surge outro "carocinho", agora na perna.

Como já fazia o trabalho de remissão (controle), foi rápida a decisão de fazer a segunda biópsia. Me despedi dos colegas de faculdade antes do fim das aulas, levei comigo a preocupação. Agora, mais "espertinha", sabia que não podia ser coisa boa. Novembro de 2006, fiz a tal biópsia, que me deixou 45 dias de muletas. No resultado, uma feliz notícia: o tumor não era maligno. Mas a tranquilidade duraria pouco... Passei o primeiro semestre de 2007 vendo aquele "caroço" aumentar, e sentido-o cada vez mais quente e dolorido. Férias de julho: aproveitei pra dar um pulo no hospital, e ver com o médico se realmente estava tudo ok. Só pela reação dele ao ver, percebi que definitivamente não estava. Mais exames, mais biópsia, só para cumprir procedimentos. O resultado já sabíamos...

De novo, imagine-se sentado na cadeira de um consultório médico. Você foi ver o resultado de uns exames, porque há algum tempo estava sentindo um "carocinho" na perna. Mas dessa vez foi diferente, bem diferente! - e eu considero como a primeira. Ele te diz: "O câncer voltou, você terá que fazer uma cirurgia pra retirar esse osso. No lugar, vou colocar osso da outra perna. A quimioterapia será feita tanto antes quanto depois". Imaginou? O primeiro pensamento: É mentira. O segundo: isso não pode estar acontecendo comigo. O terceiro: Por que eu? O quarto: Segunda tenho que voltar às aulas, e ao trabalho, o que vou fazer? O quinto: Aliás, se meu cabelo vai cair, não vou mais sair de casa. E assim por diante... Sem contar o choro, que cai adoidado. E a dor de cabeça. E a revolta. Mas isso é só no primeiro dia. E ao seu lado estão uma mãe maravilhosa e um (então) namorado mais maravilhoso ainda. Sem eles, acho que não escapava da depressão. Bem, aí o processo é longo. Dia após dia, o contato com novos sentimentos. Da temerosa primeira sessão de quimioterapia e queda dos longos cabelos à cirurgia.

2ª cirurgia - 09/11/2007: precedida de dois dias inteiros no pronto socorro do HU, já que minha vaga no quarto tinha sido transferida pra uma paciente inesperada, que havia sofrido fratura exposta no fêmur (esses dois dias merecem um texto à parte); e procedida por sofridos 13 meses de muletas. Desta vez, era véspera do meu aniversário. 19 anos e, de presente, duas pernas enfaixadas e latejando de dor. Ah, também ganhei chocolates e alguns outros mimos. Enfim, entre antes, durante e depois, com certeza essa foi a pior fase, mesmo com todo o apoio que recebi. Porque era ainda uma fase de aceitação, minha comigo mesma e com a doença. O fato de ter que ficar tanto tempo de muletas também não foi fácil. Mas quando do tratamento finalizado e minha liberação pra voltar às aulas, nem me importei com elas, nem com a careca. Queria mais era voltar logo! Deixar de lado os exercícios domiciliares com os quais tive que lidar nesse tempo de ausência, e "botar a mão na massa": gravar telejornais, produzir documentários, participar de Intercom's, de festas e cervejadas também. Tudo com as inseparáveis companheiras - as muletas e as amigas que eu levo pra vida toda, porque cuidaram de mim como se fossem irmãs. E são irmãs do coração!

3 comentários:

  1. Como diria um velho amigo meu: "gostei de sua 'roupa' nova, está mostrando teu coração".
    Bjo e não esqueça dos velhos amigos de Unicentro. rs

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  2. Me lembro do quanto inocentes éramos naquela época da escola não entendíamos nada e combinávamos de ir na sua casa depois da aula pois a falta de uma amiga como você era algo que não podíamos aceitar,dizem que criança não sabe esperar e acha que tudo e para agora não existe esperar o amanha, uma coisa eu tenho certeza valeu apena esperar a Nossa SOLa voltar,Sempre te admirei ate mesmo sem entender.

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  3. Su, eu não sabia de tudo isso... Já não tava mais por lá... Olha, você tem uma história linda, motivante, mas saiba que, se tem amigas tão especiais, que são como irmãs do coração, é porque você é uma pessoa especial. Ninguém como você passa pela vida da gente sem fazer nenhuma diferença!!! Admiro vc, menina, demais! ;) Beijos

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